Um certo dia na F/Nazca, vislumbrei uma cena que nunca esquecerei. O diretor de arte Luciano Lincoln estava folheando um One Show recente. Até aí nada de mais. A parte curiosa era que ele virava as páginas e repetia como um mantra: envelhece, envelhece, não envelhece, envelhece, não envelhece. Demorei minutos para entender o que acontecia naquela sala branca fria. Ao seu jeito, o que ele fazia era olhar para aquelas peças na tentativa de prever quais sobreviveriam com o tempo. Quais não eram apenas um modismo. Os anos passaram e mesmo com um sorriso irônico ao lembrar daquele momento, me pego fazendo esse exercício continuamente. Olho para o mundo à volta, olho para o espelho e me pergunto: envelhece ou não envelhece?
Há uns anos atrás, o trabalho era teoricamente mais simples: TV, rádio, mídia impressa e outdoor. O chamado off-line. Em uma velocidade assustadora, tudo mudou. Não perdemos nenhuma função e agregamos umas outras tantas. Os profetas do apocalipse se apressaram em dizer que a mídia tradicional estava morta. Que os tempos mudaram. Qual o raciocínio por trás? Primeiro, eu digo que todo o resto acabou. Depois, eu me posiciono como a tábua única de salvação. Uma arca rumo ao futuro onde esses arcaicos criativos assustados serão barrados. Na pressa de arrumar um cantinho na arca, off-lines apressaram-se em aderir ao discurso. E lhes digo: ex-offline é o novo ex-fumante. Chato demais. O que todos esqueceram foi um pequeno detalhe: ainda precisamos de uma grande ideia.
Gosto de citar sempre o grande Neil Ferreira. O briefing era simples: as pessoas demoram para entregar a declaração do imposto de renda. Um fato que não mudou até hoje, certo? Solução (para soar como um case): criar o leão do imposto de renda. Resultados: por mais de 30 anos, o brasileiro continua a repetir a campanha. Era genial na época. Seria ainda mais genial hoje com todas as ferramentas disponíveis. Digo mais: candidato fortíssimo a um Titanium Lion. Ganharia qualquer festival na categoria integrada. Mas pasmem: feito em 1979. Credo, diriam alguns. Eu digo: não envelhece. Porque não é modismo. É ideia.
Recomendo a leitura de artigo entitulado “Rewriting history”, no site AdContrarian. Que aliás, junto com o Dave Trott, escreve hoje os melhores textos de propaganda. O artigo mostra uma coletânea de declarações dos profetas nos anos 2005-2009. Coisas do tipo “a TV tradicional não estará aqui nos próximos 7 ou 10 anos.” “O comercial de 30 segundos, como conhecemos hoje, está morto, morrendo ou viverá até ser inútil”. E contrasta com os números da mídia tradicional hoje, nos EUA. Demolindo uma a uma as profecias. Os marqueteiros sempre superestimam o poder de atração das novas coisas e subestimam o poder de comportamento tradicional do consumidor, diz o autor na conclusão.
Old Spice não nasceu da ferramenta para virar uma campanha brilhante. Nasceu de um conceito: The man your man could smell like. E começou em um comercial de 30 segundos. Uma das melhores campanhas de Budweiser surgiu de um spot, esse então coitado, provoca erisipela só de falar. Real Men of Genius é, acima de tudo, um grande conceito. Quer falar de Darth Vader e dos seus mais de 50 milhões de views apenas no canal oficial da VW? Não, né?
Pensar primeiro na ferramenta para depois correr atrás da ideia é como buscar referências na internet e tentar achar um cliente que combine com aquilo depois. É inverter a lógica. Uma ideia ruim não fica melhor porque está integrada. Fica apenas uma ideia ruim integrada. Clap, clap, clap. Palmas para o Sr. Integrador, CEO de Buzz, o Mr. Social Media Thinker. O Mágico de Oz dos tempos modernos. Que fica escondido atrás de um termo intimidador, mas que se revela vazio ao mínimo embate de ideias.
As possibilidades são infinitas. Novas tecnologias abrem novas frentes para todos nós. Comemore esse fato. Você não domina a tecnologia? Pense em um conceito sólido e divida o trabalho com alguém da equipe que domine. Não há porque ficar acuado. A pergunta continua a mesma: envelhece ou não envelhece? E para ela, não há fórmula exata, não há método, não há o que ticar com a caneta. Há você, uma página em branco na tela e a busca por uma grande ideia. Fazer é um ofício. Parecer que você faz é uma arte. Não muito nobre, mas arte. A escolha é sua.
Coluna para a revista do AdNews.